Desesperem-se por Pinheirinho
Pinheirinho é um bairro onde quase só há núcleos familiares como o meu e o seu. Aquelas pessoas estão prestes a ver o pouco que conseguiram na vida se transformar em escombros porque a Justiça, mais uma vez, decidiu colocar famílias ao relento para proteger a “propriedade privada” em nome da qual este país erigiu uma das dez maiores desigualdades do planeta.
A comunidade do Pinheirinho fica na Zona Sul de São José dos Campos (SP). O terreno em que se situa pertence ao empresário Naji Robert Najas, envolvido em crimes financeiros. A área foi ocupada em 2004 e hoje abriga milhares de pessoas.
Criou-se ali um bairro como qualquer outro, com comércio e residências, ruas largas e organizadas, ainda que sem asfalto. As edificações são de alvenaria, a maioria sem acabamento. Nos amplos quintais, abunda material de construção – de sonhos.
Não consegui conter as lágrimas ao assistir ao desespero das centenas de famílias no vídeo que reproduzo abaixo. Prossigo em seguida.
Pinheirinho é um bairro onde quase só há núcleos familiares como o meu e o seu. Aquelas pessoas estão prestes a ver o pouco que conseguiram na vida se transformar em escombros porque a Justiça, mais uma vez, decidiu colocar famílias ao relento para proteger a “propriedade privada” em nome da qual este país erigiu uma das dez maiores desigualdades do planeta.
Por isso passei a madrugada da última terça-feira junto a milhares de tuiteiros e facebookers emitindo mensagens desesperadas naquelas redes sociais pedindo às autoridades que suspendessem a ordem judicial de reintegração de posse que seria cumprida pela PM no alvorecer.
Antes, durante o dia anterior, a mesma PM despejara de um helicóptero sobre o Pinheirinho algumas toneladas de panfletos como o que você pode conferir abaixo.
O “cidadão de bem” ao qual a mensagem se dirige é aquele que aceita pôr a própria família no relento sem reclamar ou resistir. Antes de prosseguir na leitura, pergunte-se o que você faria diante da ameaça de sua família ficar sem ter onde morar.
Na madrugada de segunda para terça-feira, amigos do Twitter e do Facebook não entenderam por que comecei a postar mensagens desesperadas copiando nelas até o governador Geraldo Alckmin e o ex-governador José Serra, pedindo suspensão da operação da PM.
Naquele momento, não podia dizer do que se tratava. Uma pessoa que tem um parente no Pinheirinho me contatou pelo Facebook, em mensagem privada, pedindo ajuda e relatando um fato que me deixaria desesperado e que, infelizmente, o site da revista Veja expôs ontem.
Meu contato com o Pinheirinho pedira sigilo para a informação que me passou apenas para que eu pudesse dimensionar a gravidade da situação. Pedia que ajudasse a repercutir que a população ameaçada estava disposta a resistir, e que pedisse publicamente a suspensão da reintegração de posse.
O alarmismo contido na campanha pelas redes sociais na madrugada de terça-feira pode ter contribuído para a concessão de uma liminar antes que o sol nascesse. A liminar foi expedida pela Justiça Federal. Estava suspensa a operação autorizada pela Justiça estadual.
Antes de prosseguir, informo o que fiquei sabendo que me fez começar a disparar mensagens alarmistas pregando a suspensão da operação policial, já que a informação se tornou pública: os moradores do Pinheirinho estocaram… gasolina!
Na verdade, o que me foi informado é que a gasolina estocada já se transformara em milhares de coquetéis Molotov (garrafas de gasolina com um pavio de pano que explodem como bombas, quando acendidas e atiradas) que fatalmente teriam sido usados.
O desespero dos moradores do Pinheirinho se deve a que o Brasil promove essas “reintegrações de posse” de terrenos abandonados que empresas mantêm como reserva de valor (como “investimento”) sem preocupação com as famílias que promovem essas ocupações por não terem meios de alugar ou comprar imóveis.
No caso do Pinheirinho, o proprietário é um escroque acusado de vários crimes e que até já cumpriu pena de prisão. Mas nem é esse o problema, já que mesmo os criminosos de colarinho branco mantêm o “direito de propriedade”. O problema é despejarem famílias sem preocupação com seu destino.
No mesmo dia (ontem) da liminar concedida suspendendo a operação ela foi cassada por quem a concedeu, o que demonstra que sua concessão objetivou ganhar tempo para que alguma solução fosse encontrada.
Não prego, aqui, o desrespeito à lei, mas que o Estado brasileiro cumpra a Constituição e faça valer a decisão da Justiça sem abrir mão de sua responsabilidade social. Despejar as famílias do Pìnheirinho intempestivamente e sem lhes oferecer um lugar digno para irem é um crime de lesa-humanidade como tantos que este país já cometeu contra o seu povo.
Tragicamente, a história recente mostra que, em um país como este, responsabilidade social, piedade, o mínimo traço de humanidade são alvo de chacota de feras humanas que enquanto eu me desesperava nas redes sociais postavam mensagens apoiando o despejo das famílias.
Estou com o coração despedaçado e os olhos cheios d’água. Não agüento, não suporto, não tolero mais a injustiça infame que se abate sobre este país. Aos 52 anos, ver a injustiça triunfar sempre e sob o júbilo de tantos compatriotas, é mais do que posso suportar.
Só nos resta o desespero pelo massacre que poderá ocorrer no Pinheirinho, com milhares de homens, mulheres e crianças que poderão tombar na linha de frente da resistência.
Que Deus tenha piedade dos brasileiros. A reintegração de posse, a batalha campal do Pinheirinho pode começar a qualquer momento. Estamos abandonados pelos poderes constituídos. Só nos restam fé, lágrimas e indignação.
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