segunda-feira, 29 de junho de 2015

A Grécia sobre o abismo. Paul Krugman apoia o "não" no referendo grego

Paul Krugman apoia o "não" no referendo grego

Enviado por C.Paoliello
Do Esquerda.net
 
 
O Prémio Nobel da Economia manifesta o seu apoio ao governo grego e esclarece que votaria 'Não' no referendo de dia 5 de julho. Paul Krugman considera que os governos credores e as instituições europeias têm cometido “um ato de loucura monstruosa” ao empurrarem a Grécia até este ponto.
“Eu votaria 'Não', por duas razões. Em primeiro lugar, por muito que a perspetiva de saída do euro assuste todos - eu incluído - a troika está agora efetivamente a exigir que o regime político dos últimos cinco anos seja mantido indefinidamente. Onde está a esperança nisso?”, questiona Paul Krugman na sua coluna no New York Times.
O Prémio Nobel da Economia avança ainda que, no âmbito de um eventual Grexit, “a desvalorização não conseguiria criar muito mais caos do que já existe, e abriria o caminho para uma eventual recuperação, tal como aconteceu em muitos outros momentos e lugares”.
“A Grécia não é assim tão diferente”, frisa.
Por outro lado, Paul Krugman alerta que “as consequências políticas de um 'Sim' seriam profundamente preocupantes”.
“A troika fez claramente o reverso de Corleone - fizeram a Tsipras uma oferta que ele não pode aceitar, e, presumivelmente, fizeram-no conscientemente. Assim, o ultimato foi, com efeito, um movimento para substituir o governo grego. E mesmo que não se goste do Syriza, isto é perturbador para quem acredita nos ideais europeus”, destaca.
“A hora da verdade da Europa”
Lembrando que, “até agora, cada aviso sobre uma rutura iminente do euro revelou-se errada” e que “os governos, seja o que for que digam durante a eleição, cedem às exigências da troika”, Krugman adianta “que a troika contava, ou pelo menos tinha esperança, que a Grécia fosse uma repetição desta história”.
O Prémio Nobel da Economia escreve ainda que, “politicamente, os grandes derrotados deste processo têm sido os partidos de centro-esquerda, cuja anuência com a austeridade dura – e o consequente abandono de tudo o que supostamente representavam - provoca-lhes muito mais danos do que políticas semelhantes provocam ao centro-direita”.
Sobre as razões que o levam a apoiar o referendo, Paul Krugman refere que, se o 'Não' ganhar, “o governo grego será empoderado pela legitimidade democrática”, o que, a seu ver, “ainda tem importância na Europa”.
Por outro lado, “o Syriza tem estado numa posição política delicada, com os eleitores furiosos com cada vez maiores exigências de austeridade mas sem vontade de deixar o euro”.
Para o economista, “o referendo irá, efetivamente, pedir aos eleitores para escolherem a sua prioridade, e dar a Tsipras um mandato para fazer o que tem de fazer” caso a troika continue a apertar o garrote ao povo grego.
Paul Krugman considera que os governos credores e as instituições têm cometido “um ato de loucura monstruosa” ao empurrarem a Grécia até este ponto.
---------
Da Folha
É óbvio, há algum tempo, que a criação do euro foi um erro terrível. A Europa nunca teve as condições prévias para uma moeda única de sucesso –acima de tudo, o tipo de união fiscal e bancária que garante, por exemplo, que, quando uma bolha imobiliária na Flórida estoura, Washington automaticamente protege os idosos contra qualquer ameaça a sua assistência médica ou a seus depósitos bancários.
Deixar uma união monetária é, no entanto, uma decisão muito mais difícil e mais assustadora do que nunca entrar nela, e, até agora, mesmo as economias mais problemáticas do continente têm recuado repetidamente da beira do abismo. Repetidas vezes, os governos têm se sujeitado às demandas dos credores por medidas de austeridade duras, enquanto o Banco Central Europeu administra a contenção do pânico do mercado.
Porém, a situação na Grécia atingiu agora o que parece ser um ponto sem retorno. Os bancos estão temporariamente fechados e o governo impôs controles de capital –limites para a movimentação de fundos para fora do país.
Parece altamente provável que o governo, em breve, tenha que começar a pagar pensões e salários em cupons, efetivamente criando uma moeda paralela. E na próxima semana o país vai realizar um referendo sobre se aceita ou não as exigências da "troika" –instituições que representam os interesses dos credores– de ainda mais austeridade.
A Grécia deveria votar "não", e o governo grego deve estar pronto, se necessário, para deixar o euro.
Para entender por que digo isso, é preciso perceber que a maioria –não todos, mas a maioria– do que você já ouviu falar sobre a prodigalidade e irresponsabilidade grega é falsa. Sim, o governo estava gastando além das suas possibilidades, no final dos anos 2000, mas, desde então, tem repetidamente cortado gastos e aumentado impostos. Os empregos públicos caíram mais de 25%, e as pensões (que foram de fato generosas demais) foram cortadas drasticamente. Se você somar todas as medidas de austeridade, elas têm sido mais do que suficiente para eliminar o deficit original e transformá-lo em um grande excedente.
Então, por que isso não aconteceu? Porque a economia grega entrou em colapso, em grande parte, como resultado das medidas de austeridade, arrastando as receitas para baixo com elas.
E esse colapso, por sua vez, teve muito a ver com o euro, que prendeu a Grécia em uma camisa de força econômica. Casos de austeridade bem-sucedida, em que os países controlam os déficits sem entrar em uma depressão, normalmente envolvem grandes desvalorizações da moeda, que fazem suas exportações mais competitivas.
Isto foi o que aconteceu, por exemplo, no Canadá, na década de 1990, e até certo ponto foi o que aconteceu na Islândia, mais recentemente; mas a Grécia, sem a sua própria moeda, não teve essa opção.
Então, eu acabei de defender uma "Grexit" –saída da Grécia do euro? Não necessariamente. O problema de uma Grexit sempre foi o risco de caos financeiro, de um sistema bancário perturbado por saques em pânico e de negócios mancos tanto por problemas bancários quanto pela incerteza do status legal das dívidas. É por isso que sucessivos governos gregos aderiram às exigências de austeridade, e por isso, mesmo o Syriza, a coalizão de esquerda no poder, estava disposta a aceitar a austeridade que já tenha sido imposta. Tudo o que pediram foi, efetivamente, uma paralisação de mais austeridade.
Mas a troika não estava tendo nada disso. É fácil se perder nos detalhes, mas o ponto essencial agora é que tem sido apresentada à Grécia uma oferta que é "pegar ou largar", efetivamente indistinguível das políticas dos últimos cinco anos.
Esta é, e, presumivelmente, a intenção era ser, uma oferta que o primeiro-ministro grego, Alexis Tsipras, não pode aceitar, porque isso destruiria a sua razão política de ser. O objetivo deve ser, portanto, afastá-lo do cargo, o que provavelmente vai acontecer se os eleitores gregos temerem suficientemente o confronto com a troika para votar "sim" na próxima semana.
Mas eles não deveriam fazê-lo, por três razões. Em primeiro lugar, sabemos agora que a austeridade cada vez mais dura é um beco sem saída: após cinco, anos a Grécia está em pior forma do que nunca. Em segundo lugar, muito e talvez o mais temido do caos da Grexit já aconteceu. Com os bancos fechados e os controles de capital impostos, não há muitos danos mais a serem feitos.
Finalmente, a adesão ao ultimato da troika representaria o abandono definitivo de qualquer pretensão de independência grega. Não se deixe levar por alegações de que funcionários da Troika são apenas tecnocratas explicando aos gregos ignorantes o que deve ser feito. Estes tecnocratas supostamente são de fato fantasistas que têm ignorado tudo que sabemos sobre macroeconomia, e estiveram errados em cada passo do caminho. Não se trata de análise, mas de poder –o poder dos credores de cortar as pernas da economia grega, que persiste enquanto a saída do euro é considerada impensável.
Então, é hora de pôr um fim ao que é impensável. Caso contrário, a Grécia terá de enfrentar uma austeridade sem fim e uma depressão sem nenhum indício de fim.
Tradução de MARIA PAULA AUTRAN

sexta-feira, 26 de junho de 2015

Como melar um processo judicial

Como melar um processo judicial

Enviado por Webster Franklin
Do blog Democracia e Conjuntura
Por Rogerio Dultra dos Santos
Imagine que você é um juiz criminal e tem dois objetivos: a) transformar-se em herói nacional, prendendo grandes executivos, parlamentares e donos de grandes empresas com estardalhaço e em rede nacional, e, ao mesmo tempo, b) contribuir para destruição de um agrupamento político importante, porém incômodo, abrindo o caminho para que as assim consideradas elites tradicionais retomem o controle do Estado.
Estes dois alvos, veja, são complexos e trazem um sem número de efeitos colaterais. Deverá evitar, acima de tudo, que os danos se voltem contra você.
Mas a receita do sucesso é relativamente simples: feche negócio com o Ministério Público, que geralmente quer ver qualquer coitado que passa pela sua frente nas grades; transforme-se em associado eletivo e fonte de informação privilegiada para jornalistas da grande mídia e, o ingrediente fundamental da receita, mele o processo, isto é, evite que ele prospere para além dos factóides que você irá criar.
Isto mesmo. Se você quer: a) aparecer de paladino da justiça, b) produzir dezenas de imagens simbólicas de empresários algemados e passando necessidade atrás das grades, durante o tempo que você quiser, c) criminalizar e, ao final, sepultar o maior partido de massas do país, abrindo as portas para o modo usual de governo das elites, faça de tudo para que ninguém seja de fato condenado. Um rico algemado no jornal de hoje vale mais que mil políticos condenados não se sabe quando e nem por quem.
Estabelecidas as linhas gerais, preocupe-se com os detalhes.
Um pormenor de peso é o seguinte: uma coisa é o processo penal e outra coisa completamente diferente são os direitos previstos na Constituição. No processo, esses direitos não precisam ser obedecidos. Como você é um juiz e não um constitucionalista, nem defensor de direitos humanos para bandido, não se importe com a Constituição nem com o “devido processo”, ou mesmo com o “princípio” da legalidade (pois é só um valor), com a ampla defesa, nem com esse negócio de presunção de inocência. Se há presunção é porque os indiciados e réus têm culpa no cartório. Em resumo: não perca tempo com direitos fundamentais. Deixe isto para os Ministros do STF (mas lembre-se, o ideal mesmo é que este processo nunca chegue lá. Você não precisa disto: a ideia é que a República caia antes).
Outra coisa relevante: nunca prenda ninguém com base em provas. Para que perder tempo e dinheiro público com investigações infindáveis, análises contábeis, escutas autorizadas, perícias de documentos, softwares, imóveis e contas, ou com testemunhas inalcançáveis. Prenda sem motivo. A doutrina o autoriza a fazer isto. Até mesmo a associação de magistrados vai apoiar a sua conduta. Praticamente todos fazem a mesma coisa. A diferença importante é que você vai fazer com ricos e políticos. Ma non troppo. Lembre-se: é tudo fogo de palha.
Agora, se você quer mesmo brilhar em cada passo, preocupe-se que, em todos os movimentos da Polícia Federal, em cada conversa de seu grupo de Procuradores com a mídia e em cada folheada dos autos em segredo de justiça sempre vaze uma coisa. Pode ser um nome, ou melhor, uma lista de nomes de políticos que supostamente poderiam ser investigados, uma conta na Suíça (mesmo que declarada no Imposto de Renda), um bilhete que seja. Cada vazamento gerará uma avalanche de suspeitas, de teses, acusações e defesas que permitirão que os seus réus sejam vistos sempre como mais culpados e mais criminosos. E isto tudo sem que você precise escrever uma linha.
Vão questionar os seus procedimentos. Afinal, ricos e poderosos geralmente têm bons advogados. Mas, lembre-se, você tem a mídia ao seu lado! Uma notícia de primeira página abafa a voz de qualquer advogado. Com a amplificação dos telejornais, com a repetição das redes sociais e com a chancela da dos periódicos impressos, as suas hipóteses virarão indícios, as suspeitas, provas e as delações – atente-se para as delações! – serão o combustível para a transmutação de qualquer dúvida em verdade.  Afinal, um dedo em riste vale mais que mil análises contábeis.
Outra coisa que vai demandar atenção é o trato com a classe política. Comece perseguindo o segundo escalão. Eles não estão acostumados a lidar com o mundo do direito. Se aproveite disso. Como você precisará de apoio nas cortes superiores para chegar ao estrelato, não se esqueça de bajular os Ministros do Supremo. Dê presentes para eles em forma de militantes presos. Um militante histórico algemado na Proclamação da República não tem preço. E irão te agradecer por isto, não colocando nenhum óbice seja na prisão dos tubarões graúdos, seja na sua futura indicação. Pense nisto com carinho. Este é o seu gol.
Mas, lembre-se, não vão deixar você em paz. Se prepare para isto e oriente seus familiares. O silêncio e a constrição são o melhor remédio. Deixe que a mídia faça o seu trabalho. Ela está ao seu lado e irá chancelar cada passo que você der. Ainda assim irão questionar a sua imparcialidade. Finja que não é contigo. Você acabará ganhando algum prêmio empresarial e sairá em editoriais e capas de jornais e revistas como um empreendedor de sucesso! Nem o Tribunal nem mesmo o Corregedor terão coragem de colocar freios em você, mesmo que você acabe falando ou dando declarações esquisitas aqui ou ali. No fundo, estarão todos te aplaudindo (ou com medo da repercussão negativa)!
Apesar de ser a sua finalidade capital, não deixe o sucesso subir à cabeça. Você será convidado para dezenas de conferências, entrevistas, clubes e jantares. Todos o festejarão no supermercado, no shopping, na farmácia. Mas é você que tem a caneta. A responsabilidade da condução do processo é sua. E quando disserem que está na hora de prender um Presidente, pense duas vezes.
Quem faz o trabalho sujo das elites tem prazo de validade. Dura o tempo que é útil. A sua principal tarefa é conseguir sair ileso do processo. Esta é a malandragem suprema. Veja: você irá desnudar como o judiciário realmente funciona – irá desagradar não somente a classe dos advogados, mas aqueles que se fiam que a justiça é correta e imparcial e aqueles que sempre se locupletaram dela mas o fizeram em silêncio; você será o vértice da luta de classes no país, pois o seu processo funcionará como catarse de uma violência social que se acumula há séculos, num país cujas elites são, no fundo, escravagistas; você colocará em questão a ordem jurídica, pois o direito e suas regras atrapalham o desenvolvimento de seu processo; você e o seu processo atacarão frontalmente a ordem democrática, já que a voz das urnas não é a voz que você ouve nas conferências, clubes e jantares – a voz das ruas deve ser calada; e você, caro amigo, você é uma peça substituível – um burocrata numa instituição entupida de burocratas com vontade de poder que nem você.
Então, agora que o seu processo está em andamento, agora que você não pode voltar atrás nem que você queira – e você, convenhamos, não quer –, chegará a hora de encarar o imprevisível. A sua malandragem será ser capaz de improvisar na imprevisibilidade e voltar toda a energia reativa já gerada contra você a seu favor. Esta é a malandragem usual da classe política e da classe empresarial. O seu problema é que você fez direito. Não é nem político, nem empresário. Vai ter que se virar nos trinta. E como dizem no teatro para dar sorte – por que isto tudo, você sabe, é uma pantomima – Merda para você!

segunda-feira, 22 de junho de 2015

Direita prefere destruir o país a aceitar justiça social


Buzz This
Post to Google Buzz
Bookmark this on Delicious
Bookmark this on Digg
Share on FriendFeed
Share on Facebook
Share on LinkedIn

fundo do poço

O biênio 2013 – 2015 ficará registrado na história como um período em que uma das maiores nações do mundo cometeu um literal suicídio. Com requintes de crueldade, tomada por um surto autodestrutivo que talvez jamais seja explicado.
Há míseros dois anos, o Brasil despontava como potência emergente – finalmente o país do futuro estava se tornando o país do presente.
A economia crescia pouco, mas crescia continuamente; a inflação estava alta por conta da forte demanda, mas estava controlada; a taxa de investimento privado vinha subindo; o desemprego caía mês a mês.
Enquanto o resto do mundo se contorcia em uma crise internacional interminável, então no quinto ano, com europeus e americanos à beira da convulsão social, o Brasil parecia uma ilha de prosperidade e estabilidade.
A nova classe média vivia um sonho dourado. Famílias viam seus filhos e netos se tornarem os primeiros universitários da linhagem, o sonho da casa própria se materializava, os salários tinham cada vez mais poder de compra.
Eis que surge, na maior metrópole do país, um movimento inexplicável. Com a renda em ascensão e o desemprego despencando, partidos de esquerda, professores universitários e estudantes desencadeiam uma guerra contra aumentos de passagens no transporte público.
As passagens de ônibus e metrô iriam subir 20 centavos. Em um momento de valorização dos salários e queda do desemprego, não era para tanto. Mas esses grupos radicalizados tinham uma proposta tentadora – para os incautos: em vez de aumentar o preço do transporte público, a endividada capital paulista deveria fornecer transporte de graça para todos.
Décadas de problemas no transporte público foram jogadas no colo do recém-empossado prefeito paulistano, Fernando Haddad.
Um prefeito que mal tomara pé da situação escabrosa da administração herdada de José Serra e Gilberto Kassab, obviamente que não tinha meios de atender à demanda surpreendente de, do nada, oferecer transporte público de graça para todos ou ao menos transferir para os cofres públicos, já combalidos, o custo dos reajustes contratuais com as empresas de ônibus.
Os grupos de ultraesquerda, porém, tinham um plano para pôr de joelhos o novo prefeito. Importaram uma tática de protestos conhecida como “bloco negro”, que se valia da destruição do patrimônio público e privado, com uso até de bombas incendiárias para parar a cidade, impedindo o trânsito nas principais vias e desesperando a população que tem que ir trabalhar e retornar para casa todos os dias.
A influência de “pensadores” de ultraesquerda sobre as mídias, sobretudo as mídias alternativas, romanceou aquele processo. Sem alguma razão lógica em um país que vinha se desenvolvendo a passos largos e distribuindo renda, aquele processo foi visto como positivo.
Eis que o governo paulista, controlado pela direita fundamentalista religiosa, opta pela violência como forma de conter os abusos contra o povo paulistano em vez de buscar diálogo. Da violência policial, brota, então, um fortalecimento do movimento radical.
Incrivelmente, os grupos radicalizados ditos “de esquerda” se voltam contra o prefeito em vez de culparem o governador, e o partido de Fernando Haddad vira a Geni das manifestações. Às dezenas de milhares, entre bandeiras de partidos como PSOL, PSTU, da Rede de Marina Silva e outros, os brados de “fora, PT!” ecoam pelos quatro cantos do país.
Agora, após a violência da ditadura tucana em São Paulo, as ruas de todo país são tomadas por centenas de milhares de congêneres dos bichos-grilos paulistas, aos brados de “Fora, PT!”. Com o Brasil vendo aquelas marés humanas bradando contra o partido que o governa, Dilma Rousseff torna-se depositária de uma revolta por vinte centavos.
Nesse momento, a extrema direita vê oportunidade que não encontrava havia mais de uma década. E sai à rua.
Todo lixo social do pais invade as ruas, agora transformadas em uma gigantesca rave em que cabiam de radicais de esquerda a neonazistas. A mídia corporativa vê a oportunidade que tanto ansiava e minimiza a insensatez que aumenta. E até a incentiva.
Eis que, em meados de junho de 2013, os autores esquerdistas daqueles protestos se dão conta de que pavimentaram as ruas para a ultradireita e se recolhem, após dobrarem os governos do Estado de São Paulo e da capital na questão dos aumentos das passagens.
Chega 2014 e a ultraesquerda tem outra ideia de jerico. Decide que a Copa do mundo era a culpada por todos os males nacionais e volta às ruas quebrando e incendiando, tentando impedir a realização do evento. O país perde a oportunidade de obter lucros altíssimos, pois o fluxo de turistas acaba sendo muito menor do que poderia.
Nas redes sociais, grupos organizados de extrema-direita e extrema-esquerda tratam de compor vídeos e memes em inglês para assustar os turistas estrangeiros, chegando a dizer que se viessem ao país correriam risco de vida devido à radicalização dos protestos contra a Copa.
Chega a eleição presidencial e Dilma Rousseff parece ter poucas chances de se reeleger. A economia já se combalia diante dos ataques pela esquerda e pela direita, que assustaram investidores e ensejaram uma progressiva paralisação da economia.
Enquanto isso, os dois candidatos de oposição mais competitivos ameaçam o país com reformas ultraliberais como privatização de bancos públicos, desvalorização do salário mínimo, independência do Banco Central.
A esquerda radical percebe que não poderia implantar o socialismo e, pior, que estava para ver surgir um regime ultraliberal que resultaria em graves retrocessos, sobretudo no que diz respeito ao processo de distribuição de renda que fizera o índice de Gini brasileiro melhorar como jamais ocorrera por aqui desde que fora criado para medir a concentração de renda das nações.
Por pouco, muito pouco, Dilma se reelege. Porém, o custo de quase dois anos de sabotagens da economia, com redução drástica de investimentos devido à insegurança gerada pela política, impõe que as políticas anticíclicas sejam abandonadas.
Não dá mais para renunciar a impostos para manter o ritmo da economia, do crescimento, dos salários e da queda do desemprego. Há que fazer um ajuste fiscal. Muito mais brando do que seria feito pelos principais candidatos a presidente derrotados por Dilma, mas, ainda assim, um ajuste duro, pois implicaria em um freio de arrumação na economia.
Sem novas sabotagens, porém, em alguns meses estaria tudo resolvido. A economia daria uma parada, mas, no segundo semestre – agora com os investidores mais confiantes devido ao equilíbrio entre receita e despesa –, o país recomeçaria a crescer, o emprego voltaria a subir, os salários a se valorizar e a desigualdade a cair.
Eis que a extrema-direita se recusa a aceitar o processo de soerguimento do país. Unindo-se à centro-direita tucano-midiática e a grupos radicais conservadores incrustados na Polícia Federal e no Ministério Público, desencadeia uma ofensiva “contra a corrupção” que paralisaria a economia ao emitir sentenças condenatórias contra grandes empresas antes do devido processo legal.
Já não é mais polêmico dizer que a política está destruindo a economia. Todos já reconhecem que a política está afundando o país.
Os grupos de ultradireita fazem a festa. Pouco lhes importa o futuro. Só a destruição da esquerda – inclusive daquela que tanto os ajudou – interessa. Saem à rua, agora sem pudor, e pedem nada mais, nada menos do que um golpe militar. A esquerda a tudo assiste impassível, em seu “mimimi” contra medidas econômicas sem as quais o país afundaria muito mais.
Esse é o resumo da ópera. A direita radical ataca por um lado, a esquerda radical ataca por outro e o país mergulha em um buraco político, econômico e institucional cujo fundo ainda não é possível vislumbrar.
Em breve, os próximos capítulos do suicídio do Brasil.

sexta-feira, 12 de junho de 2015

O fim patético da Lava Jato

ScreenHunter_5889 Jun. 12 13.03

O fim patético da Lava Jato

No dia 13 de novembro de 2014, uma reportagem de Julia Dualibi, no Estadão, informava que os delegados da Lava Jato faziam festinha pró-Aécio nas redes sociais. Incluindo o principal responsável pela operação Lava Jato na Polícia Federal, o delegado Igor Romário de Paula.
Igor Romário de Paula aparecia nas redes sociais louvando Aécio Neves, do PSDB, um dos candidatos com a ficha mais suja de que temos notícia em nossa história recente: acusações de corrupção, o nepotismo mais descarado (que ele herdou de sua própria história, pois ele, Aécio, é filho do nepotismo, tendo vivido toda sua vida de empregos públicos obtidos através de indicações familiares), ataques à liberdade de imprensa, violência contra mulher, bebidas, drogas, uso do dinheiro público para construir aeroportos em terra da família, nomeação de juiz acusado de vender sentenças de soltura para traficantes, amizades com donos de helicópteros apreendidos com meia tonelada de pasta de cocaína, etc.
Um candidato, diga-se de passagem, acusado diretamente pelo principal delator da Lava Jato, a investigação conduzida por Igor Romário de Paula, de receber 120 mil dólares por mês de propinas, o que daria, em valores de hoje, quase meio milhão de reais/mês.
Desde então, a Lava Jato começou a se transformar-se rapidamente. De uma operação de combate à lavagem de dinheiro por parte de várias empreiteiras, converteu-se numa investigação política, visando asfixiar a indústria de construção civil, por um lado, e criminalizar o PT, de outro.
Daí tivemos uma série de prisões ilegais. O tesoureiro do PT, por exemplo, foi preso sem que houvesse absolutamente nenhuma prova contra ele.
A acusação: as doações legais, registradas no TSE, de empresas ao PT.
As mesmas empresas doaram valores da mesma magnitude, ou até mais, à oposição. Mas apenas as doações ao PT foram criminalizadas.
Numa tática que cheira aos momentos mais arbitrários da nossa história, o juiz mandou prender não apenas João Vaccari Neto, mas sua família: mulher e cunhada.
A cunhada foi presa “por engano”. O desespero de prender era tão grande que a confundiram com sua própria irmã.
A Lava Jato entrou em parafuso, distribuindo acusações a políticos sem relação alguma com a investigação principal. Um político do PP foi acusado de incorporar a sua empregada doméstica à folha de pagamento de seu gabinete. Uma coisa antiética, mas sem nenhuma vinculação, obviamente, com lavagem de dinheiro, Petrobrás ou corrupção partidária.
O André Vargas, ex-deputado do PT, que não é flor que se cheire, foi acusado de ter “presença” na Caixa, e com isso, supostamente, beneficiar a agência de publicidade de seu irmão. Nada a ver com lavagem de dinheiro ou Petrobrás.
E agora, o mesmo delegado disse que investigará Lula por conta dos serviços que o ex-presidente prestou para empresas de construção civil.
A mídia, como sempre, é a grande articuladora de todas essas denúncias. Tudo é milimetricamente planejado. Sai numa revista aqui, vai para uma TV ali, aparece num jornal, numa dessas jogadas ensaiadas tão características da nossa imprensa, e que a faz parecer realmente um cartel mafioso.
Agora sabemos que o ex-presidente FHC recebeu mais de 16 milhões de reais apenas em suas doações iniciais, quando saiu do governo, mais de quatro vezes acima do valor pago pela Camargo Correia ao Instituto Lula.
A mídia quer que Lula viva de quê?
Lula não tem a cara de pau de FHC, de usar milhões de reais de Lei Rouanet (público, portanto) para organizar seu “acervo”.
Como Lula sustentará seu instituto?
FHC viaja ao mundo falando mal do Brasil e recebendo por isso.
O Instituto Lula produz estudos e palestras em prol dos países mais pobres, como África, e de combate à fome.  A contribuição de Lula na luta mundial contra a miséria e a desnutrição foi prestigiada há algumas semanas, em evento da FAO, a organização das Nações Unidas que cuida exatamente dessas questões.
Lula abriu o encontro. A mídia, como sempre escondeu ou diminuiu.
Ao contrário, a mídia apenas opera, dia e noite, para destruir Lula politicamente, massacrar sua imagem.
De certa forma, tem conseguido seu objetivo, como se vê nas manifestações crescentes de ódio contra o PT.
Não é difícil, numa democracia, fazer o povo se voltar contra seus próprios herois.
Infelizmente, esse é um dos vícios inerentes a democracias. Sócrates foi condenado à morte por “corromper os jovens”. Esse foi o prêmio final da democracia ateniense a seu cidadão mais ilustre.
Heródoto, o historiador grego, fala ainda de grandes generais atenienses, como Temístocles, responsáveis por vitórias épicas dos atenienses contra exércitos persas numericamente muito superiores, que depois foram perseguidos e até mesmo banidos por seus próprios cidadãos, em virtude de intrigas domésticas.
Talvez a característica mais marcante de uma democracia seja esta intriga aberta, que se confunde com o próprio jogo político.
Em ditaduras, as intrigas são asfixiadas imediatamente com violência e repressão.
Numa democracia, as intrigas se convertem em lutas políticas, travadas por meio da comunicação.
Por isso, a mídia é a questão política central da nossa democracia. Talvez mais importante, num primeiro momento, que a reforma política.
Um candidato pode até se eleger sem dinheiro, mas não sem uma boa imagem na mídia.
Para que serve o dinheiro nas campanhas, em termos estritamente eleitorais? Não é para comprar a mídia, ou fazer a sua própria mídia?
Uma reforma política começa e termina com uma reforma da mídia, uma reforma que obrigue todos os canais de tv a exibirem, em horário nobre, debates eleitorais entre candidatos a presidente, governador, prefeitos, deputados, senadores, vereadores. Uma reforma de mídia que estenda a campanha política pelo máximo de tempo possível, diluindo os custos.
O Brasil irá vencer esses esbirros da ditadura, essas conspirações conduzidas por uma mídia cevada no dinheiro e na violência de um regime de exceção.
Uma mídia que jamais se interessou em fomentar a inteligência crítica dos brasileiros. Ao contrário, seu único objetivo é ampliar o seu exército de zumbis.
Uma mídia vendida em todos os sentidos.
Não promove alimentação saudável porque não pode ir de contra aos interesses de seus patrocinadores.
Nunca promoveu debates em prol políticas de transporte coletivo, porque precisa vender carros.
Nunca promoveu debates políticos inteligentes, porque precisa empurrar, goela abaixo da população, os seus lobistas de baixo nível, que irão cuidar de suas negociatas, aqui e no exterior.
A Lava Jato é fruto desse sistema. Ela é uma iniciativa desesperada de setores corruptos da mídia, da sociedade e do Estado, setores dispostos a destruir muita coisa, se isso lhes permitir a volta de um tucano ao poder.
Um tucano que ajude o cartel mafioso midiático a sobreviver por mais alguns anos.
Espera-se, todavia, que ainda existam juízes com alguma fibra moral, capazes de resistir a esse jogo pesado de chantagens políticas e midiáticas.
Ao atacar Lula, a Lava Jato expôs-se excessivamente e decretou seu fim moral.
Um fim patético de uma operação golpista liderada por agentes públicos sem qualquer compromisso com a realidade social. Não se importam em promover desemprego ou atraso de obras estratégicas.
Pior, agentes públicos sem qualquer compromisso com valores democráticos: prendem sem provas, condenam sem provas, promovem linchamento midiático através de vazamentos seletivos.
O juiz da Lava Jato exibiu, na frente de todo mundo, a propina que lhe foi entregue, em mãos, por um dos irmãos Marinho: o prêmio Faz Diferença.
E assim vamos tocando a vida.

Policia-Federal-Curitiba20150114-20-size-598
ScreenHunter_5889 Jun. 12 13.03
ScreenHunter_5890 Jun. 12 13.03

quarta-feira, 3 de junho de 2015

Petrobras + Fazenda: uma solução conhecida contra o caos, por Roberto Requião

Petrobras + Fazenda: uma solução conhecida contra o caos, por Roberto Requião

Petrobras + Fazenda: uma solução conhecida contra o caos
Roberto Requião(*) 
Não me confundo com a oposição, mas não posso esconder a minha angústia em relação à realidade econômica nacional. O tempo urge para que tomemos providências que se oponham ao caos que se anuncia. Este artigo busca fazer uma análise crítica do momento em que vivemos e propor uma saída conhecida, porém eficaz.
Estamos em uma situação econômica de tal gravidade que o único ponto de equilíbrio que nos oferecem é o da contração da produção e do emprego, já em marcha, como apontam todos os indicadores. O ponto de equilíbrio que nos oferecem é o ponto de equilíbrio da depressão.
É assustadora a previsão de alguns economistas de que  teremos uma contração da ordem de 5% neste ano – sendo 2% negativos por conta do ajuste-Levy, e 3% negativos por conta da Operação Lava Jato.
O impacto, no caso desta última, é a paralisação ou a diminuição dos investimentos da Petrobrás, investimentos que se refletem numa cadeia produtiva estimada em 13 a 17% do PIB.  Um impacto fortíssimo.
A declaração de inidoneidade de grandes empresas, por parte da Justiça Federal do Paraná, se efetivada, tem o potencial de destruir 500 mil empregos diretos e 1,5 milhão de empregos indiretos nos Estados produtores de petróleo e de equipamentos.
E isso se estende à receita de Estados e municípios, que por sua vez já estão paralisando pagamentos de fornecedores e até de pessoal, criando o que se chama risco sistêmico, afetando inclusive bancos.         
Essa tragédia é desnecessária. Não há qualquer razão jurídica, econômica ou filosófica que leve a se confundir empresa com empresário, imputando as empresas, inclusive a Petrobrás, os crimes ou fraudes dos empresários ou seus executivos. Empresas não são homens, são ferramentas na mão dos homens.
Por que algo conceitualmente tão simples não resultou ainda em um entendimento franco entre Governo e Judiciário a fim de limpar a estrada para a retomada dos investimentos da Petrobrás?
Parece que não há  hoje, na República quem tome decisões definitivas. Temos a sensação desconfortável de que o país está à deriva. As instituições republicanas esfrangalham-se, esfarrapam-se. O Legislativo é bloqueado pelo Executivo, o Executivo é bloqueado pelo Judiciário. O Judiciário, às vezes, bloqueia-se pelo comportamento de seus próprios agentes em razão de ações inconstitucionais, arbitrárias, oportunistas ou contraditórias. O juiz que se apodera de bens de um denunciado que sequer foi julgado, talvez não seja mais que um exemplo.
É inevitável a sensação de falta de autoridade legítima, quando se confere poderes exagerados a um tecnocrata para gerir a área estruturante do Governo. Hoje nada funciona no governo e na economia em geral sem a anuência ou ao menos a influência do Ministério da Fazenda.
Abstraio-me aqui de toda consideração de caráter partidário ou pessoal, o que me opõe ao ministro Levy é a sua obsessão por políticas neoliberais anacrônicas que estão destruindo a Europa e outros países.     
Ultra-ortodoxo em suas convicções, Levy recusa-se a aceitar o conhecimento econômico básico de que nenhum país deve fazer política de ajuste recessivo em situação de estagnação ou de recessão. Ora, estamos em recessão, ou crescimento zero, desde o ano passado.
O ajuste realmente necessário não é nas contas públicas. É nas contas externas que precisamos fazer um ajuste. Nosso déficit público é decorrente basicamente dos juros extraordinariamente altos e da recessão causada em grande parte por esses juros.
Nesse momento de recessão, o governo deveria apoiar o investimento público e privado para fazer a economia voltar a crescer, e não afugentá-los com cortes orçamentários e juros elevados.
O ministro, no entanto, reduz a economia às relações contábeis, ignorando tudo mais, notadamente as questões humanas e sociais relativas ao emprego, à renda real, à produção, ao bem-estar dos cidadãos.     
Em razão poder absoluto sobre as áreas econômicas, do vazio de um Congresso virtualmente omisso ou sem rumo, da simpatia da mídia monopolista e conservadora, o ajuste-Levy é um risco para a Nação Brasileira. Infelizmente, o ministro tem a cabeça feita e jamais recuará dessa política.
Levy se transformou em um superministro, com poderes extraordinários, pela omissão de uns e oportunismo de outros. Bizarramente, vemos invertida a configuração entre Governo e oposição. Os oposicionistas não atacam Levy porque são unhas da mesma carne, enquanto os governistas ficam inibidos de atacá-lo, porque ele é ministro do governo que apoiam.
Ainda assim, apesar desse maniqueísmo, dessa visão dicotômica das coisas, dessa disputa de torcidas organizadas, que sempre se acentua em situações de crise, o Congresso é, paradoxalmente, o único foro para tomada de decisões que resta à República  em sua defesa.
Nessa “sinuca de bico”, precisamos esquecer velhas disputas políticas, ainda que temporariamente, e buscar um caminho comum para a salvação da Nação Brasileira, que está sendo atacada em suas bases econômicas e em sua soberania.
Mas esse não é nosso único problema. A Petrobrás e o Pré-Sal são hoje nossa esperança de saída da crise e superação do subdesenvolvimento. Nenhum de nós ignora o que a empresa representa e ainda pode representar para a economia nacional
Não estou falando em termos românticos, sobre o que significa a Petrobrás para a alma brasileira, fruto que foi de um dos maiores movimentos de massas que tivemos em nossa história. Falo da Petrobrás objetivamente, como fonte de emprego, de impostos, de renda, de acumulação de tecnologia nacional.
Essa Petrobrás responde diretamente por algo entre 13 a 17% da economia, sendo a espinha direta e indireta a sustentar milhões de empregos no país. Mas como anda a Petrobrás com a Operação Lava Jato?
Cito informações veiculadas pelo jornal O Globo, há duas semanas. Textualmente: “A promessa do Pré-Sal não fará mais da Petrobrás a principal locomotiva do crescimento econômico do País nos próximos anos.
No novo Plano de Negócios de 2015 a 2019 que, segundo fontes, deve ser divulgado no dia 10 de junho, a estatal vai pisar no freio na tentativa de reduzir o seu nível de endividamento.
Os investimentos vão oscilar de 129 bilhões de dólares – (387 bilhões de reais)- a 141 bilhões de dólares (423 bilhões de reais) no período, conforme dados da própria companhia.
Ou seja: o menor nível de investimentos desde a crise global de 2008 e representará uma queda de até 41% em relação ao Plano anterior, de 2014 a 2018, de 220,6 bilhões de dólares (661,8 bilhões de reais).”
Em razão da drástica redução planejada pela Petrobrás, o investimento vai passar de uma média anual de 35 bilhões a 40 bilhões de dólares, até 2014, para 25 bilhões de dólares a 29 bilhões de dólares, até 2019.
“Esse freio será muito ruim para a indústria e para a economia – argumenta José Velloso, da Associação Brasileira das Indústrias de Máquinas, a Abimaq – pois a Petrobrás responde pela metade dos bens de capital comprados no país”.
Parar a Petrobras por meios judiciais, administrativos ou contábeis tende a arrastar para o fundo do poço toda a economia.  Por motivos puramente ideológicos, um monocrata da Fazenda não pode exigir a redução intempestiva e radical dos investimentos da empresa. O motivo alegado é reduzir o endividamento da empresa para apenas 282,1 bilhões de reais – uma ninharia em face do patrimônio de trilhões de dólares armazenados no Pré-Sal. Esse equívoco ficou mais dramático depois que a empresa divulgou que atingiu um custo na extração de petróleo de apenas nove dólares por barril, pois isso torna qualquer endividamento para extrair esse petróleo barato e sustentável.
Ademais, ainda que consideremos a Petrobras uma empresa como outra qualquer e o investimento no Pré-Sal como outro qualquer, sabemos que é possível aumentar o investimento reduzindo a dívida: bastaria que o governo promovesse um aumento soberano no capital da empresa.
Mas a Petrobras não é uma empresa como outra qualquer, é uma das bases de nossa economia e de nosso desenvolvimento tecnológico. Isso deve relativizar as decisões públicas sobre o nível de endividamento da empresa, que, aliás, não é nada alto, se comparado ao seu patrimônio.
O desemprego está aumentando velozmente: a taxa fechou o primeiro trimestre em 7,9%, sete décimos acima da taxa do primeiro trimestre do ano passado, e 1,4 ponto acima do quarto trimestre do ano passado.   
Os números absolutos, embora impressionantes, não são os mais relevantes. O importante é detectar qualitativamente a tendência. E a tendência – no contexto do ajuste-Levy e da degradação da economia – é de uma piora substancial.
Os economistas que tenho consultado e muitos que publicaram artigos recentemente falam que, se nada for feito, a taxa de desemprego pode chegar a um nível recorde da ordem de 15% até o ano que vem. Assim, desgraçadamente, conheceremos, então, o que é uma grande depressão, o que não conhecemos nem nos anos 30 do século XX, quando o mundo sucumbiu. Seria uma tragédia, como hoje vivenciada por vários países europeus.
Os economistas que nos alertam não falam isso para que aconteça ou torcendo para que aconteça. Pelo contrário, falam para que não aconteça. As previsões econômicas são portadoras desse paradoxo: se aquele que prevê tem credibilidade, o pior não acontece porque, em face dessa credibilidade, os agentes econômicos com o poder de tomar decisões cuidam de tomá-las na direção de se evitar o pior. Concordo com eles,  e espero que nosso governo mude e impeça que as previsões se realizem.
Gostaria muito que o senhor Joaquim Levy levasse em conta esses alertas e tomasse as providências necessárias. Entretanto, não acredito que ele vá fazê-lo.  Ele é vítima de uma ideologia, a ideologia monetarista, que só confia em taxas de juros estratosféricas, superávits primários e câmbio livre – o famoso tripé o mesmo  que ancorava  as políticas anunciadas por candidatos da oposição na última eleição presidencial.
Levy é o homem do corte. O homem da tesoura, como se dizia dele quando esteve à frente da Secretaria do Tesouro.  Não é o homem dos investimentos, dos direitos sociais, do emprego, do crescimento, dos projetos nacionais. Dependendo dele, vamos nos afundar cada vez mais na recessão e na depressão.
Para restabelecer a normalidade no mercado interno e na economia do petróleo a solução seria simples e conhecida:
1º- O Tesouro, exercendo sua soberania, emite títulos da dívida pública para repassar os recursos equivalentes à Petrobrás, através do BNDES.
Com esses recursos, a Petrobrás sustenta seus investimentos nos níveis necessários para cobrir as despesas correntes, de caixa e de ampliação da capacidade produtiva.
Assim, ela preserva e amplia sua agenda de investimentos, pelo menos ao nível de outubro do ano passado, quando a crise tornou-se aguda.
2º- Em contrapartida, a Petrobrás pode emitir debêntures conversíveis em ações, a fim de dá-las em garantia do empréstimo do BNDES.
Apenas essa providência restabeleceria a corrente de pagamentos e recebimentos da Petrobrás, possibilitando a restauração também da cadeia de recebimentos e pagamentos das empresas privadas que são fornecedoras dela.
Com isso, eliminamos os três por cento de queda do PIB por conta da Petrobrás. Restariam os dois por cento por conta do efeito Levy. Para estabilizar a economia, e eliminar a taxa negativa de 2%, teríamos duas alternativas: ou Joaquim Levy muda a política econômica recessiva que adotou ou ele se despede do Governo possibilitando a salvação da Nação.
A política econômica em curso vai destruir as relações federativas na medida em que estrangulará os estados e municípios na sua capacidade de pagar a dívida pública gerida pelo Governo federal.
É dispensável dar números porque todos sabem que a dívida dos Estados, que cresceu exclusivamente por conta de juros elevados que gera passivos impagáveis, especialmente numa economia em recessão.
A linha de solução é acabar com a crise sistêmica na raiz: o crédito e o investimento público. Uma vez restaurada a linha de crédito, pelo Tesouro e BNDES, em favor da Petrobrás, salvam-se as empresas fornecedoras dela; com isso, salvam-se também os orçamentos de Estados e municípios sob influência direta ou indireta da Petrobrás. Quer dizer, praticamente a totalidade dos municípios, considerando-se as conexões paralelas na economia.       Salvam-se, sobretudo, centenas de milhares de empregos,  o que deve ser nosso foco principal.
Qual seria o obstáculo para começar essa reversão da economia? É o ministro da Fazenda, não por sua pessoa, mas por sua política. Ecônomos como ele acham que a dívida pública não pode crescer em circunstância alguma, mesmo na recessão e na depressão. Aliás, se a dívida crescer em razão dos juros altos não tem problema para eles...
É a mais radical interpretação e aplicação do monetarismo vulgar. Sim, porque em determinadas circunstâncias, como em situação de calamidade, crise social ou guerra, até mesmo Friedman, o pai do monetarismo clássico, admitia o aumento da dívida pública.
E nós estamos em guerra. Uma guerra contra a depressão e o desemprego é o equivalente fiscal de uma guerra real. Nessa guerra, é absolutamente legítimo recorrer ao Tesouro para salvar a Nação.
Dirão os monetaristas vulgares que isso geraria inflação. Mas como, se a economia está em recessão, caminhando para a depressão? Inflação de demanda só existe quando o consumo supera a oferta. Estamos numa situação em que o consumo, afetado pelo desemprego e pela queda da renda do trabalho, está muito aquém da oferta.
A inflação que está aí é fruto exclusivamente da indexação remanescente na economia, do repique cambial, do reajuste radical dos preços administrados exigido por Levy e da política de juros, que afeta custos; logo,  não tem nada a ver com aumento da moeda e da dívida.
Paradoxalmente, alguns bancos e seus fraternos jornalistas só consideram desastres os aumentos acima de 0,01 ponto na taxa de inflação. Mas, para eles, tudo bem, se a inflação aumenta em razão de medidas antissociais como reajuste preços administrados, aumento de juros, indexação de preços ou aumento de juros.
Esses jornalistas amigos das finanças ficariam estarrecidos, se o aumento da dívida mobiliária fosse usado para ajudar a Petrobrás a superar a crise. Diriam que isso levaria ao rebaixamento da nota do Brasil pelas agências de risco internacional. Paradoxalmente, se esse aumento fosse decorrente de um aumento exagerado dos juros, eles não ficariam assustados,  e nem as agências de risco.
Esse tipo de “raciocínio” é uma boa combinação de estupidez com ignorância. Afinal, não há nada mais desmoralizado no mundo hoje, depois da crise de 2008, do que agências de risco. Todos os representantes das principais agências foram chamados às falas pelo Senado norte-americano e alegaram que suas notas não passam de “opinião”.
Com isso, tiraram sua responsabilidade em relação às previsões róseas que fizeram dos títulos-lixo aos quais davam as notas máximas antes da crise. Era mera opiniã, muito lucrativa, aliás.
Não acredito que as agências de risco irão rebaixar a nota da Petrobrás e do Brasil. O tesouro do Pré-Sal nos tornou uma nação financeiramente rica. Por isso, temos um ótimo crédito, como mostraram recentemente os chineses. Mas se nosso crédito for rebaixado, temos uma excelente alternativa: o Banco dos BRICS, que está pronto para ser acionado, e que não foi acionado ainda porque há resistências impertinentes no Banco Central brasileiro à conversão de parte ínfima das reservas externas brasileiras em capital do banco.
Sim, o Banco Central do Brasil também faz política externa. Com apoio do Levy, o BC está resistindo ao maior lance estratégico do Brasil desde a fundação da República, a aproximação com os demais países do BRICS.       
A interação entre uma mídia hostil e as forças políticas oposicionistas, junto com a ambiguidade do governo e a perplexidade da esquerda, diante do rumo tomado pela política econômica, criou entre nós a situação de caos percebida por grande parte da população.
Não há rumo em nossa política. Cada um pensa por si. No Congresso, presidente da Câmara não se entende com presidente do Senado, ambos não se entendem com lideranças do Governo; deputados e senadores agem individualmente, nem sempre com objetivos definidos, terreno fertilíssimo para o oportunismo e o aparelhamento partidário do Estado.
Por que vivenciamos essa situação? Simplesmente porque a única coisa mais ou menos definida trazida ao Congresso é uma política econômica que agride a nacionalidade.
Isso leva a uma resistência da Nação real, ao mesmo tempo em que possibilita aos arrivistas tentar encontrar um espaço confortável junto aos atores da política econômica que, circunstancialmente, mandam no país.
Entretanto, como não estamos apenas em uma crise fabricada, mas sim em uma crise que se tornou efetiva, aos poucos as forças produtivas reais, empregados e empregadores, tomam consciência de que é sua sobrevivência que está em jogo e, portanto, precisam reagir.      
E a única reação possível é o combate à política econômica do senhor Levy e a substituição dessa política recessiva por uma política comprometida com o crescimento e o desenvolvimento econômico e social brasileiro.
Ponho-me aqui, teimosamente, a repetir quantas vezes for possível: destruamos a política econômica neoliberal, anti-Brasil, anti-povo, anti-emprego, anti-produção de Joaquim Levy.  Ela deve ser destruída, antes que destrua o Brasil.
Talvez haja uma solução menos traumática. Levy, sendo um homem honrado, pode simplesmente procurar a Presidente e devolver-lhe o cargo sob o argumento de que sua política não confere estabilidade ao Governo. E a Presidente, refletindo sobre o conjunto da situação, nomearia uma equipe progressista homogênea para garantir essa estabilidade.      
A razão para isso é simples: Levy não teve seus projetos aprovados no Congresso por seu conteúdo, mas pela aritmética partidária. A oposição votou contra os projetos em que acredita, e a situação votou a favor de projetos em que não acredita. Francamente, isso jamais produzirá estabilidade política no país.
Portanto, mais uma vez: delenda est a política econômica neoliberal.     
(*) Roberto Requião é Senador da República e ex-governador do Estado do Paraná.