A ética dos “homens bons”
31 de maio de 2014 | 12:49 Autor: Fernando Brito
Num mundo dominado por um pensamento que coloca o lucro como a razão suprema da vida social, não é estranho que, ao se pensar no que é ter razão, imagine-se que mais razão tem quem mais dinheiro ganha.
E quem mais razões supremas pode ter senão aqueles que, neste mundo sem razões que não a grana, que os grandes banqueiros internacionais?
Eles são os que dizem, com seus “ratings”, suas “boas práticas” e seus critérios sobre que economias são viáveis e quais são “populismo” insustentável.
Os governos devem, em lugar de ouvir os povos que os elegem, ouvir o mercado, porque é de lá que vem a virtude.
Afinal, o lucro é sempre bom e santo, e os impostos são perversos.
O Estado é mau, ineficiente, perdulário, corrupto.
Mauro Santayana, em seu blog, traz um pequeno relato, abafado por nossa valorosa imprensa, muito ocupada em vasculhar a honradez de todo e qualquer um que defenda um regime de mínimos controles do capital, limitando seus apetites pantagruélicos.
Afinal, os banqueiros são homens bons, diferentes desta camorra política, à qual, infelizmente, tem-se de suportar, por causa desta coisa miserável chamada voto, que bem podia ser substituída por um conselho dos ricos, porque são eles que, afinal, têm razão porque têm dinheiro.
Os oráculos da pilantragem
Mauro Santayanna
A Comissão Européia acusou, formalmente, na semana passada, os bancos HSBC, Crédit Agricole e JP Morgan, de promover acordos, por debaixo do pano, para manipular a taxa interbancária EURIBOR – que afeta diretamente o custo dos empréstimos para os tomadores.
Do golpe, participavam também o Barclays, o Societé Generále, o Royal Bank of Scotland, e o Deutsche Bank, já condenados, pelo mesmo crime, em dezembro, a pagar multa de mais de um bilhão de euros.
O Deutsche, maior banco da Alemanha, teve de ser capitalizado em 8 bilhões de euros, esta semana, para para não quebrar. O Banco Espírito Santo, de Portugal, também a ponto de quebra, foi acusado, pela KPMG, de graves irregularidades em suas contas. E o Crédit Suisse foi condenado a pagar 2.6 bilhões de dólares à justiça dos EUA, por favorecimento ao desvio de divisas e à sonegação de impostos.
Para Bertold Brecht, era melhor fundar um banco que assaltá-lo. E Bernard Shaw lembrava que não há diferença entre o pecado de um ladrão e as virtudes de um banqueiro.
O mundo muda. Hoje, uma diferença de menos de 2% separa o peso das seis maiores economias emergentes das seis maiores economias “desenvolvidas” e as reservas em mãos do primeiro grupo quase triplicam as do segundo.
Mas, no Brasil, continuamos ouvindo, como se fossem oráculos, a opinião dos banqueiros estrangeiros, que só estão em nosso país para organizar a espoliação sistemática de nossas riquezas e do nosso mercado.
Lá fora, a opinião pública chama essa gente de banksters (foto) unindo em uma só palavra o termo bankers(banqueiro) e gangsters (bandidos).
Aqui, o que diz um representante deles – que estão quebrando ou são acusados de crimes em seus países de origem – é sagrado.
Independente de quem estiver no poder no governo, o Brasil, se quiser continuar atraindo dinheiro externo, precisa estabelecer instrumentos próprios de defesa da imagem do país lá fora, criando, como se está projetando fazer com os BRICS, agências próprias de qualificação, bancos de fomento, fundos de reserva, etc.
Até mesmo porque a credibilidade das principais agências de qualificação que existem hoje está tão baixa, no exterior, quanto a dos bancos, aos quais tantas vezes se aliam e protegem, para enganar e pilhar países e correntistas.
É preciso que aprendamos a não dar ouvidos aos enganosos oráculos da pilantragem.
Assim como no Brasil, na China os maiores bancos são estatais, e a dependência de capital externo no mercado financeiro é – até por uma questão estratégica – marginal e quase irrelevante.
A diferença que existe entre nós e eles – prestes a se transformar na maior economia do planeta – é que, no Brasil, a opinião de instituições externas, acusadas de envolvimento em duvidosos episódios e nas últimas crises internacionais, orienta e pauta as ações do governo, e vai para a primeira página dos jornais.
Em lugares como Pequim e Xangai, o país, os empreendedores e os consumidores, estão se lixando, redondamente, para a opinião dos bancos ocidentais.