sexta-feira, 28 de novembro de 2014

O socialismo está em crise? E o capitalismo?

O socialismo está em crise? E o capitalismo?

Se a construção prática do socialismo enfrentou problemas, o que dizer dos resultados apresentados pelo capitalismo? Como anda a África, por exemplo?


Wadih Damous (*)
Arquivo

A queda do Muro de Berlim e a extinção do bloco socialista na Europa do Leste fizeram a alegria dos defensores do capitalismo. Houve até quem, como Francis Fukuyama, decretasse o fim da história: a partir dali, afirmava ele, não haveria mais solavancos. As coisas aconteceriam sem mudanças radicais na sociedade.

Fukuyama não foi o primeiro a vaticinar o caráter perene de uma determinada situação de hegemonia. O Império Romano já falava nisso. Vindo mais para perto no tempo, poderia ser lembrado também o “Reich dos Mil Anos”, apregoado pelos próceres do nazismo, e que, em vez de mil, mal durou 15 anos...

De qualquer forma – é preciso reconhecer – as experiências socialistas enfrentaram percalços para transformar em realidade os sonhos de milhões de lutadores sociais que as defenderam ao longo dos últimos cento e poucos anos.

Essas dificuldades têm que ser objeto de estudo. A compreensão de suas razões será importante para a construção do futuro.

Questões relacionadas com a democracia e o desenvolvimento da produtividade do trabalho, e das forças produtivas em geral, estão a clamar por respostas. Ao não serem resolvidas, empurraram aquelas sociedades para uma excessiva estatização e uma burocratização que criou camadas privilegiadas e parasitárias – o que lhes foi fatal.

Mas, seria o caso de, por isso, se abdicar do socialismo, de se jogar fora a criança juntamente com a água da banheira?

Penso que não.

Essas dificuldades têm que ser vistas como desafios a serem vencidos para os que não têm o sistema capitalista como solução para os problemas da humanidade.

Por isso, é preciso travar o debate ideológico. E, se a construção prática do socialismo enfrentou problemas, o que dizer dos resultados apresentados pelo capitalismo? Como anda a África, onde, em pleno século 21, milhões de seres humanos são desnutridos e morrem de fome? O que o capitalismo trouxe para essas pessoas.

Mas, deixemos de lado a África - continente que, ainda hoje, enfrenta as consequências da escravidão, que retirou durante mais de três séculos sua força de trabalho mais qualificada. Vejamos o que o capitalismo oferece aos cidadãos na maior potência econômica da história.

Como anda a assistência de saúde nos Estados Unidos? Por incrível que pareça, lá não existe sequer um sistema universal de saúde, algo correspondente ao nosso SUS (mesmo com os problemas que o SUS possa ter). Quem não tem plano de saúde privado está arriscado a morrer diante de um hospital sem ser atendido. Isso é civilização?

Aos incrédulos, eu recomendaria que assistissem ao filme “Sicko”, realizado em 2007 pelo cineasta americano Michael Moore, que mostra o quão excludente é o sistema de saúde nos Estados Unidos.

E nem só de fracassos viveram as experiências socialistas até agora existentes. 

Vejamos Cuba, por exemplo: é um país pequeno, sem grandes recursos naturais e que apresenta alguns indicadores sociais de fazer inveja. Seu índice de mortalidade infantil – critério usado pelas Nações Unidas para medir a qualidade de vida, pois, quando se esta se deteriora as crianças são a parcela da população mais vulnerável – é o melhor da América Latina, sendo superior até mesmo ao dos Estados Unidos.

Por outro lado, seu sistema educacional - que abrange todas as crianças do país, sem exceção - tem recebido os maiores prêmios internacionais da Unesco, à frente de todos os demais países da América Latina.

Cuba é um país pobre. Deve ser comparada não às nações do Norte da Europa, mas às da América Central, como Guatemala, Honduras ou República Dominicana. Quem vive melhor? A população desses países, que são capitalistas, ou o povo cubano, apesar de todos os problemas que tem diante de si?

Assim, a discussão sobre os problemas do socialismo tem que ser enfrentada sem subterfúgios. Mas considerar que, devido às dificuldades (algumas delas oriundas do bloqueio e da sabotagem de países capitalistas, diga-se), a solução estaria no capitalismo é um enorme engano.

Que, nestes tempos de confusão ideológica e amesquinhamento de objetivos, as correntes progressistas não percam essa verdade de vista.

 
(*) Advogado

quinta-feira, 27 de novembro de 2014

Reflexões de Nova York

Reflexões de Nova York

ny_miolo

A análise de conjuntura está paralisada por algumas indefinições.
Por exemplo, o blogueiro Luis Nassif publicou uma série de posts sobre um 
possível golpe eleitoral, costurado no judiciário, com a entrega da relatoria das 
contas de Dilma em mãos do ministro Gilmar Mendes, conhecido por um 
oposicionismo estridente. Segundo Nassif, Gilmar tentará usar dados da operação
 Lava Jato, que prendeu donos de empreiteiras que doaram para a campanha de
Dilma, para impugnar sua vitória.
O fato das mesmas empreiteiras terem doado para a campanha de Aécio, contudo
, dificultará a manobra.
De qualquer forma, essas paranoias, fundadas ou não, terão vida curta, visto que 
o TSE terá de aprovar as contas da campanha da presidenta até o próximo dia 10 
de dezembro. Uma eventual impugnação das contas, por sua vez, deverá ser feita
 até sexta-feira agora.
*Com exceção desse fantasma incômodo, marcado para desaparecer dentro de 
alguns dias, a política segue seu curso normal, dentro das circunstâncias da nossa
 jovem e nervosa democracia: a saber, diariamente uma nova leva de crises política
s e escândalos.
Às vezes eu me pergunto se ainda há alguém que realmente lê as reportagens 
sensacionalistas sobre a corrupção na Petrobrás.
A agenda política da imprensa ficou tenebrosamente chata, deprimente e 
tendenciosa.
A oposição e a mídia bem que tentaram jogar o peso das denúncias apenas nas 
costas do PT, mas a operação não deu certo.
Pode não ser agora, mas em algum momento, a presidenta Dilma e o PT serão 
vistos como os mocinhos nesta história: foram eles que deram autonomia e 
condições à Polícia Federal para investigar.
O fato da PF pegar diretores da Petrobrás e servidores ligados à base aliada 
apenas reforça o republicanismo heroico, às vezes quase suicida, do governo.
Ao que parece, a PF desbaratou outra quadrilha com conexões dentro do governo:


 os procurados tinham ligações familiares com o ministro da agricultura.
Ponto para a PF e para o governo.
*Passei uma semana em Nova York – por isso o título – e aproveitei para comprar 
jornais e revistas, por lá.
No New York Times, li uma extensa reportagem sobre o sistemático desvio de 
recursos e armas fornecidos pelo governo americano ao exército do Iraque.
Os generais iraquianos recebem as armas doadas pelo Pentágono, dão metade
 para seus soldados, e vendem o resto.  Fazem isso com recursos, alimentos,
 roupas.
Inflam as folhas de pagamento com soldados-fantasma, para ficarem com os
 salários.
Fazem tudo isso num país devastado pela miséria, fome, guerra, doenças, 
fanatismo e terrorismo.
Enquanto os soldados morrem em emboscadas organizadas por grupos 
terroristas cada vez mais presentes e perigosos, os oficiais enriquecem à custa 
do sangue de seus próprios compatriotas.
É uma lógica macabra: quanto mais terrorismo, mortes e caos, mais os EUA 
mandam recursos e armas, e mais os corruptos ganham dinheiro.
Nos últimos 10 anos, as cifras desviadas montam a dezenas de bilhões de dólares.
O nervosismo dos americanos cresce junto com a expansão do Estado Islâmico e
 outras organizações no Iraque. Alguns falam em repassar dinheiro diretamente 
às tribos sunitas dispostas a combater o terrorismo, mas o governo iraquiano
 rejeita duramente essa possibilidade, alegando que iria violar a soberania do país
 e acirrar as rivalidades étnicas internas (o governo é dominado por xiitas, 
adversários dos sunitas).
Todos os analistas entrevistados, do governo, do exército e da iniciativa privada, 
concordam que há um problema ainda maior que a corrupção do oficialato e do
 governo iraquianos: a total impossibilidade de investigar e punir oficiais ligados 
ao governo.
Os únicos punidos são oficiais ligados aos adversários do atual presidente do
 Iraque.
Ainda no Times, topo com uma matéria curta, sem destaque na primeira página, 
sobre um dos mais sangrentos atentados ocorridos este ano no Afeganistão. 
Um homem bomba explodiu numa partida de volei numa cidade do interior do
 país, matando mais de 50 pessoas e deixando centenas de feridos.
Há alguns anos, uma coisa assim ganharia destaque na capa de todos os jornais.
 Hoje, é notinha sem importância.
Na Síria, a guerra civil já matou centenas de milhares de pessoas, e desalojou 
outras milhões. Igualmente, há muita corrupção envolvida. Os recursos e armas 
doados pelo Ocidente aos “rebeldes” que lutavam contra o governo sírio, acabaram
, ó cruel ironia, em mãos de terroristas do Estado Islâmico.
Todo o oriente médio parece viver um pesadelo. A primavera árabe se tornou um
 circo de horrores.
O Egito, agora novamente governado por um militar, voltou a ser uma ditadura. 
Na área do Monte Sinai, próximo à fronteira com Israel, o governo bombardeia
 civis e destrói casas, num esforço nada humanitário para encerrar o contrabando.
Segundo a Economist, os reinos árabes descobriram uma nova e cruel maneira 
de lidar com opositores: tirar suas cidadanias. No Kwait, um empresário dono de
 um canal de TV que fazia oposição ao governo, perdeu a cidadania. Sua TV foi 
fechada. E ele está prestes a ser deportado, não se sabe para onde, já que não 
tem pátria.
A Ucrânia, que também viveu uma revolta do tipo “árabe”, com o povo nas ruas 
pedindo (e obtendo) a renúncia de um presidente eleito, vive uma terrível crise 
econômica. O PIB deve fechar o ano com uma queda superior a 10%, e a dívida 
externa do país explodiu. A Economist pede ao FMI e aos países ricos que 
emprestem mais alguns bilhões para a Ucrânia, em troca, é claro, de mais 
interferência em sua política econômica.
Todos os países que viveram “revoluções” ou mudanças violentas de governo nos
 últimos anos – Egito, Líbia, Síria, Iraque, Ucrânia – estavam muito melhor antes 
do que hoje.
Os EUA têm responsabilidade fundamental diante do sofrimento de milhões e 
milhões de pessoas. Esse tipo de crítica, contudo, não aparece na mídia 
norte-americana.
O México vive uma crise política bastante séria, após o assassinato covarde de 
43 estudantes numa cidade do interior.
A Economist tenta uma defesa canhestra de Henrique Peña Neto, presidente do
 México, dizendo que ele foi eleito com grandes expectativas e elogiando as suas 
medidas neoliberais, como entregar o petróleo do país a estrangeiros. A revista é
 obrigada a admitir, porém, que os mexicanos já não gostam de seu presidente.
Recentemente, descobriu-se que Neto mora numa casa de 7 milhões de dólares
 pertencente a um empreiteiro da região natal do presidente, e que por pouco não
 ganhou um contrato bilionário para construir um trem de alta velocidade, num 
projeto do governo.
Assim como no Iraque, o problema da corrupção mexicana é que não há 
investigação de membros do governo; quando há, é rapidamente abafada.
No Brasil, é tudo ao contrário. Só há investigação de membros do governo. A 
oposição é sempre poupada.
Enquanto isso, a nossa imprensa vende ao distinto público que o problema é o
 “bolivarianismo”.
*Entretanto, há um lado saudável nessa cruzada da imprensa comercial contra o 
governo.  Já ouvi diversos comentários sobre isso de gente bastante antipática 
ao PT. É a noção de que, com o PT, a imprensa não abafa.
Isso também ajuda a explicar a vitória de Dilma Rousseff.
Em se tratando de corrupção, havia o temor de que a vitória do PSDB
 desencadeasse, na imprensa e nos órgãos de investigação, uma gigantesca 
reviravolta.
A grande mídia deixaria de ser de oposição, e se tornaria despudoradamente 
chapa-branca.
O Ministério Público, o Judiciário e a Polícia Federal perderiam subitamente o 
furioso entusiasmo investigatório antigoverno que mostram hoje.
A corrupção voltaria a ser varrida, alegremente, para debaixo do tapete.
*Estou devendo a continuação do post sobre Enzo Tortora, o maior escândalo
 judiciário da Itália em várias décadas. Fá-lo-ei em breve, talvez amanhã, se não 
houver nenhum golpe a ser debelado.
*A leitura de reportagens sobre a situação no Iraque, Afeganistão, Síria, Ucrânia,
 me fez refletir que devemos agradecer pelos problemas que temos.
Nossa mais atual crise política, por exemplo, tem como pano de fundo uma
 grande investigação feita pelo próprio Estado contra membros do próprio governo,
 e contra alguns dos homens mais ricos do país. Isso é muito raro em qualquer 
parte do mundo.
Na China, de vez em quando há processos amplos contra a corrupção dentro do
 governo, mas sempre são direcionados a personagens ligados aos adversários
 do comitê central.
As democracias ocidentais, todavia, não são nenhum paraíso anti-corrupção. 
Nem a corrupção jamais foi monopólio de estatais. Ao contrário, as crises 
financeiras vividas pelos países ricos nos últimos 15 ou 20 anos tiveram, todas,
 como epicentro, a corrupção de grandes corporações totalmente privadas. 
Os governos dos EUA e da União Europeia, tiveram que despejar trilhões de 
dólares, sacados da conta-imposto dos contribuintes de cada país, para pagar
os estragos causados pelo jogo sujo de algumas gigantes do mercado financeiro, 
que sempre operaram em conluio com a mídia.
As investigações contra os responsáveis por essas crises deixam sempre a
 desejar, mesmo nas democracias mais sólidas.
Por isso, é importante considerarmos que, em meio a tantas crises políticas, 
estamos aos poucos forjando uma cultura de investigação e republicanismo que
 merece a nossa admiração.
Claro, sabemos que, por trás das investigações, há interesses políticos e pressões
 midiáticas, ambos nada republicanos, mas isso é inevitável.  Faz parte do jogo.
Desde que não se queira violar a soberania do povo e derrubar um presidente
 eleito, sem que haja uma evidência bastante concreta de seu envolvimento 
pessoal, a disposição do Estado de investigar a si mesmo é digna de mérito.
*Diante dos massacres cotidianos vistos na Síria, no Iraque e no Afeganistão; do 
ebola na África; das guerras civis sanguinárias se alastrando; do assustador
 avanço do fanatismo, de um lado, e da tirania, de outro, no oriente médio;
 diante de tudo isso dá até vontade de rir da nossa irritação contra a… Katia Abreu.
No entanto, continuo com a mesma opinião.
A maneira como o nome dela foi divulgado, num contexto de total apagão político
 e comunicacional do governo, me pareceu um grande erro.
A mesma coisa vale para o novo ministro da Fazenda, Joaquim Levy.
Em minha estada em NY, percebi uma coisa. Tanto o presidente dos EUA, Barack
 Obama, como seus secretários, se pronunciam quase diariamente sobre os 
principais problemas do país.
Claro, a imprensa de lá é infinitamente mais plural.
Mesmo assim, há um esforço, por parte dos políticos, de falarem diretamente a 
seus eleitores. Isso não é considerado bolivarianismo.
O presidente Obama divulga vídeos de suas falas. As TVs reproduzem porque 
lhes dá audiência.
É sempre tranquilizante ouvir a opinião do presidente, mesmo que não se 
concorde com ele.
Por que Dilma não explica, em vídeo, as razões que a levaram a escolher um
 ministro da Fazenda com perfil mais conservador?
Os movimentos sociais e os intelectuais de esquerda continuariam não aprovando,
 mas o diálogo ficaria mais aberto, mais transparente.
Além disso, o governo parece agir sempre como se fosse ilegal fazer política.
A mídia é a principal responsável por essa estranha jurisprudência. Que só vale 
para o PT, aliás.
Se Dilma não quer fazer isso, se quiser preservar sua imagem, então arrume um 
porta-voz, que possa falar diariamente à população, desfazendo boatos,
 explicando diretrizes.
No caso da Katia Abreu, por exemplo, seria importante o governo vir à público
 falar que, independente do nome indicado para a pasta da Agricultura, terá esta e
 aquela diretriz no setor agrícola.
*A Globo está fazendo um jogo esperto: posando de defensora do governo contra 
a militância do PT, tratada como um bando de idiotas radicais.
O editorial de hoje consegue uma proeza linguística: elogia as opções 
conservadoras do governo para a agricultura e fazenda ao mesmo tempo em que
 detona o governo e, sobretudo, a esquerda e a militância, que ousam protestar.
O governo tem de tomar cuidado para não entrar nesse jogo, que é uma armadilha.


 A militância é seu único aliado verdadeiro contra a mídia, que forma o principal e


 mais perigoso partido de oposição.
Se há divergências entre a militância e o governo, não devem jamais ser dirimidas
 por notinhas plantadas na imprensa, e sim através de um diálogo franco, aberto e
 transparente.
*O governo Dilma não pode esquecer a lição de junho de 2013.
Popularidade de Ibope e Datafolha não vale nada sem base social.
Na primeira crise, evapora.
Ouvir a base social, além disso, é respeitar a democracia; e ajuda o governo a
 melhorar sua gestão.
Foi uma excelente notícia, por isso mesmo, que Dilma tenha recebido, ontem, 
Frei Beto e Leonardo Boff, e declarado que haverá “um diálogo permanente, 
orgânico, contínuo, com os movimentos sociais e com a sociedade em geral”.
Sem esse diálogo, o governo apenas ouve a sociedade através da grande mídia, 
e por isso ouve mal, ouve errado e ouve mentiras.
Outra frase de Dilma serve de lição à militância, de que deve permanecer sempre
 crítica e rebelde: “Eu prefiro escutar críticas, do que apenas escutar as coisas
 boas que eu faço. Porque aí eu aprendo”.
Não se ajudará o governo com elogios.
O governo não é perfeito. Dilma não é perfeita. Ambos tem defeitos, vícios e
 limitações. Seguramente irão errar muito nos próximos quatro anos.
É importante que todos os setores, em especial as correntes progressistas, que
 apoiaram a eleição da presidenta, expressem suas críticas, com franqueza, para
 que as correções de rumo sejam feitas para o lado certo, para o lado do povo.
*No post anterior, alguns leitores – em especial a ala coxinha – protestaram contra 
o gráfico abaixo, dizendo que ele estava distorcido. Não estava. Está
 rigorosamente correto. Vou repeti-lo.
ScreenHunter_5395 Nov. 24 22.36


A escala está muito bem explicitada no eixo da esquerda.
O objetivo de um gráfico como esse é dar destaque à variação.  É assim que se
 faz gráfico, em toda a parte, em todo mundo. A Bovespa, por exemplo, publica 
seus gráficos com a variação diária do índice Ibovespa da mesma forma. O de 
ontem:
ScreenHunter_5396 Nov. 27 09.23

Observem que a escala tem início no 54.977, de maneira que a variação de 56.077
 pontos para 54.977 dá a impressão de uma montanha russa. Se o gráfico 
iniciasse no zero, a noção visual da mudança seria prejudicada.
A crítica que fazemos aos gráficos da Globo é quando estes violam a escala. 
Ou seja, seria distorção se a coluna referente aos 51 bilhões parecesse menor 
que a de 49. Por incrível que pareça, é isso que a Globo tem feito.
O gráfico que eu publiquei mostra que os investimentos estrangeiros diretos no 
Brasil permanecem elevados.
São investimentos em produção, de longo prazo.
O mundo acredita no Brasil e os temores apocalípticos promovidos pela mídia são
 puramente especulativos.

sábado, 22 de novembro de 2014

O tucano que iluminou o Brasil


O tucano que iluminou o Brasil

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Semler


Ricardo Semler tem o perfil tucano padrão. Rico, 55 anos, paulista, empresário de renome, é hoje vice-presidente da Fiesp, além de CEO (executivo-chefe) e sócio majoritário da empresa Semco S/A. E não tem apenas perfil tucano; é filiado ao PSDB. E das antigas. Filiou-se quando Franco Montoro presidia o partido.
Semler tornou-se conhecido por ter implantado em sua empresa fórmulas inovadoras de gestão empresarial. Sob sua gestão, o faturamento da empresa subiu de quatro milhões de dólares em 1982 para 212 milhões de dólares em 2003.
A revista TIME elegeu o executivo paulista como um dos “100 Jovens Líderes Globais”, em 1994. O Fórum Econômico Mundial também o apontou em trabalhos semelhantes. Foi exaltado como gestor pelo Wall Street Journal – como “Empresário do Ano na América Latina”, em 1990, e “Empresário do Ano no Brasil”, em 1992.
Semler formou-se em Direito na USP e estudou Administração em Harvard. Além disso, escreveu livros que se tornaram sucesso em vendas no Brasil e exterior.
Na última sexta-feira (21), o empresário surpreendeu o país com um artigo no jornal Folha de São Paulo na linha super sincero. No texto, reconheceu que, apesar da gritaria hipócrita entoada hoje sobre corrupção – sobretudo na imprensa –, nunca se roubou tão pouco neste país.
O artigo em questão se espalhou como fogo e provocou polêmica apesar de não conter novidade. Tivesse sido escrito por um petista ou mesmo por um cidadão sem coloração partidária, teria passado batido. O que fez o texto repercutir tanto foi o fato de seu autor, declaradamente tucano, contrariar o discurso de seu partido.
O artigo de Semler gerou polêmica a partir do título: “Nunca se roubou tão pouco”. Dali em diante, sem abrir mão do discurso tucano contra o PT – de que, ao longo dos governos Lula e Dilma, houve corrupção e barbeiragens na economia –, o empresário tucano demonstrou que é possível defender as próprias bandeiras políticas e ideológicas sem cair no mau-caratismo.
O discurso de Semler em um texto literalmente antológico e que, a esta altura, quem se interessa por política com certeza já leu, se fosse entoado por Fernando Henrique Cardoso faria dele alguém que seria respeitado pela maioria, em vez de repudiado.
Infelizmente, à diferença do correligionário no PSDB, FHC se entregou à politicagem mais barata que se possa conceber, causando surtos de indignação quando se dá ao desfrute de fazer acusações de corrupção aos adversários políticos. Justamente ele, FHC…
Alguns dirão que Semler se contradiz porque reconhece que a corrupção desbragada que existia antes de o PT chegar ao Poder também existiu no governo federal de seu partido e, à diferença de hoje, não foi investigada.
Pela lógica binária, portanto, se o empresário reconhece que sob o PT a corrupção diminuiu, em vez de ter votado em Aécio Neves deveria ter votado em Dilma Rousseff. Este blogueiro, porém, entende que cada um tem o direito de votar de acordo com seus próprios interesses.
Explico: apesar de achar que os empresários brasileiros estarão mais bem-servidos por um governo que não joga nas costas do povo o preço da crise internacional, pois assim esse povo continuará movimentando a economia, Semler vive entre os ricos empresários paulistas, relaciona-se com eles, faz negócios com eles e com o resto do mundo capitalista. Por certo, não seria bem aceito em seu meio se fosse filiado ao PT, ao invés de ao PSDB.
Também dirão que Semler poderia não integrar partido algum. Mas como, se tem uma visão política tão clara e saudável como a que demonstrou em seu artigo?
Em minha visão, Semler é mais útil ao país sendo filiado ao PSDB do que ao PT. Por que? Simplesmente porque constitui uma reserva de sensatez e espírito público em uma agremiação que vem se perdendo em hipocrisia e cegueira política, ideológica e social.
Trocando em miúdos: ter gente como Semler dentro do PSDB ajuda a impedir que o partido piore ainda mais, mesmo que esse empresário provavelmente tenha pouca influência junto às hostes tucanas.
Ao ler o artigo de Semler, é quase impossível não sentir-se tentado a ser tão sincero e isento quanto ele. Aliás, sempre digo que isenção é para poucos – e sempre para os mais lúcidos e inteligentes.
Nesse aspecto, nós – blogueiro e leitores concordantes ou discordantes – que vivemos a política tão intensamente sentimos uma ponta de constrangimento porque estamos a anos-luz de sermos capazes de gesto igual ao de Semler.
Aliás, para um simpatizante ou um filiado tucano é muito mais fácil ser sincero, neste momento, do que para um equivalente petista, pois o governo recém-eleito de Dilma Rousseff está sob ameaça de golpe “paraguaio”, de modo que quem não se dá ao luxo da sinceridade de reconhecer as falhas do PT, como o empresário reconheceu as do PSDB, é porque sabe que não dá para ficar criticando o partido do governo sem ajudar aqueles que querem estuprar a democracia e jogar fora os votos de 54 milhões de eleitores.
Contudo, façamos uma concessão ao que chamo de o bom PSDB, ou seja, o PSDB que não existe mais, o PSDB daquele que Semler disse que assinou sua ficha de filiação ao partido, Franco Montoro, ou o PSDB do inesquecível Mario Covas.
Lembro-me de Montoro em 1982, lutando contra Reinaldo de Barros, candidato de Paulo Maluf ao governo de São Paulo, em um debate da campanha eleitoral para governador, naquele ano – a primeira eleição de governador após a ditadura.
O filho de Montoro André, é uma decepção. Politiqueiro, incapaz de um mísero gesto de sinceridade. Mas o pai, ah, o pai… Franco Montoro era daqueles políticos que já não se faz mais, assim como Mario Covas.
Mesmo os mais jovens devem se lembrar de Covas, em 2000, quase consumido pelo câncer interrompendo o tratamento derradeiro para apoiar Marta Suplicy contra Paulo Maluf no segundo turno da eleição para prefeito de São Paulo apesar de seu candidato, Geraldo Alckmin, ter sido derrotado no primeiro turno.
Aliás, lembro-me de Covas, na campanha a governador de São Paulo em 1998, sendo traído por FHC, que apoiou Maluf escancaradamente contra um correligionário. Quanta diferença entre Covas e FHC…
FHC Maluf
Aliás, votei em Mario Covas algumas vezes. No primeiro turno de 1989, pois então eu achava Lula “muito radical” – apesar de que votei no petista no segundo turno, contra Collor –, e quando a escolha foi entre o mesmo Covas e Maluf.
E, em 1982, é claro que votei em Montoro contra Reinaldo de Barros.
Semler resgatou o PSDB decente e social-democrata que poderia existir, mas que foi corrompido por FHC e se tornou a excrescência que é hoje. Um partido ligado à extrema-direita e povoado por ricaços insensíveis, racistas e egocêntricos.
Quanto ao PT, Semler tem lá sua dose de razão. Rendeu-se ao establishment, em grande parte. Mas enxergo que o fez porque não havia alternativa – ou melhor, havia: entregar o país a uma direita das piores que há no mundo.
Apesar de o PT ter admitido gente como um André Vargas em suas fileiras, apesar de ter apelado ao mesmo caixa 2 que o PSDB e todos os outros partidos sempre apelaram, ainda é o partido que tem a proposta mais aceitável para o país.
O que me leva a apoiar o PT tão decididamente – e estou certo de que Semler entende motivos como o meu – é que, apesar dos pesares, o partido tem uma proposta invencível: divide melhor os sacrifícios que o país tem que fazer.
Por fim, um tucano iluminar de forma tão digna e decente o país, como fez Semler, permite-me fazer uma concessão à sinceridade: talvez devamos, tucanos, petistas etc., refletir que ninguém é necessariamente bom ou mau só por ser petista, tucano, corintiano ou palmeirense.
*
Leia, abaixo, o artigo antológico de Ricardo Semler publicado na Folha de São Paulo de 21 de novembro de 2014

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Blog da Cidadania por Eduardo Guimarães

sexta-feira, 21 de novembro de 2014

Nunca se roubou tão pouco

Não há mais clima para golpe. Dilma vence 3º turno

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Hoje eu vinha com a faca nos dentes, mas mudei de ideia.
Cansei de falar em golpe, e tenho a impressão que a atmosfera de terceiro turno arrefeceu.
O fantasma do golpe foi esmagado pelo próprio desespero da mídia.
A tese que ventilei por aqui, de que Dilma sairia fortalecida desse escândalo, como a presidenta republicana que permitiu a investigação a fundo de problemas históricos de corrupção em nossa maior estatal, está se confirmando.
A mídia bem que tentou, mas não conseguiu colar no escândalo o carimbo “Exclusivo PT”.
Ele atinge todos os partidos e todas as grandes empreiteiras.
Empreiteiras estas que fazem obras em todas as prefeituras e em todos os estados brasileiros, governados por todos os partidos.
Empreiteiras que também financiam a grande mídia.
A imprensa alternativa, os blogs, nunca levaram um centavo das empreiteiras.
A grande imprensa levou bilhões.
O escândalo da Petrobrás atinge toda a classe política, e em especial os principais partidos, a começar pelo PSDB.
Por exemplo, o maior corrupto do “petrolão”, até o momento, é um senhor chamado Pedro Barusco, que prometeu devolver US$ 100 milhões aos cofres públicos.
Ele era subordinado a Henrique Duque, que a imprensa quer vender apenas como “ligado ao PT”.
Ora, Duque está na Petrobrás desde 1978. Desde 2000, era Gerente de Contratos da área de Exploração e Produção.
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Sobre Barusco, não encontrei sua biografia, mas é sintomático que ele, logo após se aposentar, tenha ido dirigir a área de operações da Sete Brasil, a poderosa companhia responsável por fornecer sondas de exploração para a Petrobrás.
Quem é o principal acionista da Sete Brasil? O banco BTG Pactual, cujo dono é o tucano André Esteves, o qual, segundo reportagem do Globo, pagou a viagem de lua de mel de Aécio Neves e esposa.
Descobriu-se também que Gilmar Mendes, quando advogado geral da União, nomeado por FHC, defendeu exatamente o que se tornou a fonte maior de corrupção na Petrobrás: a realização de contratos sem licitação. Mendes também não ofereceu nenhuma proposta para aumento da transparência.
Hoje Mendes posa de paladino da ética na grande imprensa, bravateando frases de efeito.
Não é possível partidarizar o escândalo.
A ladainha da mídia, de que tudo é culpa de PT, não cola mais.
Não se combaterá a impunidade no país prendendo-se exclusivamente petistas.
Que se condene e prenda os petistas corruptos!
Mas será que nunca veremos um tucano preso?
Até quando o PSDB seguirá sendo blindado pela mídia, pelo Judiciário e pelo Ministério Público?
Sonegação, helicóptero com meia tonelada de pó, assassinato de modelo, afundamento de plataforma, compra de reeleição, privataria, construção de aeroporto em terras da família, ossada humana em fazenda.
Não faltam escândalos tucanos!
Mesmo o que a mídia chama de “petrolão”, tentando quase infantilmente repetir o case de sucesso do “mensalão”, começou em 1999, ou seja, logo após a reeleição comprada de FHC!
Por isso, é tão bem vindo o artigo do empresário tucano Ricardo Semler, publicado na Folha de hoje.
Semler reitera que o mérito pelas investigações atingirem a profundidade que se vê, pegando peixes graúdos da estatal e do setor privado, é da presidenta Dilma.
“É ingênuo quem acha que poderia ter acontecido com qualquer presidente. Com bandalheiras vastamente maiores, nunca a Polícia Federal teria tido autonomia para prender corruptos cujos tentáculos levam ao próprio governo.”
(…)Dilma agora lidera a todos nós, e preside o país num momento de muito orgulho e esperança. Deixemos de ser hipócritas e reconheçamos que estamos a andar à frente, e velozmente, neste quesito.”
O tucano, num corajoso ataque à hipocrisia da nossa mídia, afirma ainda que a corrupção não se limita a empresas públicas.
“O que muitos não sabem é que é igualmente difícil vender para muitas montadoras e incontáveis multinacionais sem antes dar propina para o diretor de compras.”
O que se espera das pessoas cujo bom senso ainda não foi devastado pelo ódio partidário, é um pacto pela democracia, dando tempo e espaço para a presidenta Dilma concluir o processo de depuração da Petrobrás.
Ela prometeu em sua campanha que não “sobraria pedra sobre pedra”.
É o que está acontecendo.
Passada a tempestade, o Brasil sairá mais forte e mais limpo.
A Petrobrás adotará protocolos mais transparentes e seguros para impedir a corrupção, deixando para trás o afrouxamento das regras imposto por FHC e defendido por Gilmar Mendes.
Não há mais clima para golpe.
Até mesmo as paranoias sobre um suposto golpe no tribunal eleitoral, a ser dado por Gilmar Mendes, me parecem agora infundadas.
Agora só falta o governo fazer as mudanças que todos esperam, a começar pela comunicação.
Ontem o presidente Obama anunciou medidas que protegerão mais de 5 milhões de imigrantes ilegais nos EUA.
Assistindo a alguns canais de TV fechada, zapeei pela Fox, onde âncoras republicanos atacavam a iniciativa, e pela MSNBC, onde analistas democratas a defendiam.
Em todos os canais, porém, o presidente Obama tinha espaço. Ele aparece falando, longamente, explicando sua política.
Na MSNBC, a âncora entrevista um dos secretários de imprensa da Casa Branca, um gordinho simpático e bem humorado.
Aí eu fiquei pensando novamente que o governo brasileiro deve ser o único do mundo que não tem um porta-voz, não tem um secretário de imprensa, não tem ministros políticos, não tem um relações públicas.
E a imprensa brasileira é a única do mundo que censura o próprio governo do país.
A quem interessa esse tenebroso apagão político do governo?
Esperemos que o escândalo da Petrobrás, onde a mídia, em especial a Globo, ainda tenta construir uma narrativa diabólica, sirva ao menos para que o Executivo acorde para a necessidade de construir canais mais democráticos de comunicação com a sociedade.
Informação de qualidade e acesso ao governo eleito são direitos humanos e políticos de todo o brasileiro.
Não adianta o Mercadante dar entrevista à Miriam Leitão, na Globonews, uma tv fechada à qual poucos brasileiros tem acesso.
É preciso ocupar, democraticamente, as tvs abertas, as rádios, e as redes sociais, e combater o mal do novo século: a desinformação.